quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Do silêncio do lar

Casos de assédio sexual acontecem em sua maioria dentro de casa. O silêncio funciona como parede para acobertar os crimes.
Matéria da Revista Espaço Aberto, 2 de julho de 2009
por Mariana Franco


A notícia é chocante, a situação, quase irreal. O caso, complexo. Sophie, a menina austríaca, morreu no Rio de Janeiro. A tia, com quem morava, é suspeita de tortura. A menina e o irmão não foram entregues ao pai, o austríaco Sascha Zanger, que brigava pela guarda das crianças, por pesar sobre ele a acusação de abuso sexual contra o filho mais velho.

Este caso, por seu absurdo, pelo fato de as crianças serem europeias, por ter culminado com a morte violenta da vítima, rompeu as barreiras de casa e chegou à grande mídia. Os crimes de violência doméstica e abuso sexual, entretanto, são comuns e ficam, em sua maioria, na obscuridade.

Começando a digitar no buscador do Google as letras da palavra “violência”, as sugestões de resultados que primeiro aparecem são as de violência doméstica. Figura em casos de violência doméstica qualquer tipo de agressão física, psicológica ou mental dentro do ambiente familiar.
No Juizado Especial de Violência Doméstica Contra a Mulher, inaugurado em janeiro, chama a atenção o crescimento de registros de casos de assédio sexual contra crianças e adolescentes. Théo Lerner, coordenador do Programa de Atenção à Violência Sexual (Pavas) da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), atenta para o fato de que o que aumenta não são os casos de abuso sexual em geral, mas os casos que chegam a ser denunciados. Lerner conta que em 1996, no início do programa que dá assistência psicológica a vítimas deste tipo de violência, os atendimentos eram de 48 meninas para cada menino. Hoje são atendidos casos de um para um.

O que define abuso sexual não é necessariamente o toque, a violência física ou a falta de consentimento, mas sim a sexualidade vinculada ao desrespeito ao indivíduo e seus limites.
A maioria dos casos de assédio se dá dentro de casa, por pessoas próximas da família. A falta de denúncia por parte do abusado e de pessoas próximas (seja do ambiente familiar ou escolar, por exemplo) é comum por conta de o problema ser tão delicado e vergonhoso diante da sociedade. O silêncio, nestes casos, é como uma parede concreta a acobertar o crime.

Se por muitas vezes as vítimas têm medo ou vergonha de ir à polícia, ações de humanização do atendimento ajudam a combater essa resistência e viabilizar a denúncia. Programas como o Bem-Me-Quer, do Hospital Pérola Byington, desenvolvido pela Secretaria estadual de Segurança Pública, centralizam em um único local o atendimento criminal e médico, evitando que a vítima precise transitar da delegacia para o IML para realizar uma denúncia. Logo em seguida, no mesmo local, a vítima recebe acompanhamento médico, psicológico e social, que pode se estender por mais tempo e também a outros membros da família.

Já o Pavas do HC-USP oferece acompanhamento psicológico gratuito para vítimas de violência sexual. A partir do agendamento, por telefone, de uma triagem, estabelece-se uma agenda de tratamento. “Cada caso é único e requer estratégia de tratamento específica”, explica Théo Lerner.

Serviço:
Hospital Pérola Byington

Local: av. Brig. Luís Antônio, 683, Bela Vista
Fone: (11) 3248-8038
Recebe casos com Boletim de Ocorrência, encaminhados pela delegacia.

Pavas-FMUSP – Programa de Atenção à Violência Sexual
Fone: (11) 3061-7726
Agendamento de triagem e consulta por telefone

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